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1. Introdução
O regime de autorização geral (RAG) é um elemento essencial do Código Europeu das Comunicações Electrónicas (CECE) e da Lei das Comunicações Eletrónicas1. Este regime foi introduzido no quadro regulamentar das comunicações eletrónicas através da Diretiva 96/19/CE2 e consolidado com a Diretiva 2002/20/CE3. O objetivo da sua implementação consistiu primordialmente em eliminar as barreiras regulamentares e simplificar a entrada de novos operadores no mercado das comunicações electrónicas no espaço da UE.
O enquadramento legislativo nos vários Estados-Membros tem vindo a ser alterado de forma a permitir uma efetiva harmonização dos procedimentos para a autorização das empresas de comunicações eletrónicas operarem no mercado desde a implementação do RGA, em conformidade com o quadro regulamentar europeu.
Apesar das melhorias introduzidas desde a sua adoção, o BEREC publicou recentemente um projeto de parecer4 no qual apresenta uma análise exaustiva do funcionamento do RGA. Neste documento, o BEREC analise em detalhe os temas relacionados com a aplicação dos artigos 12.º a 19.º do CECE, o sistema de notificação pelas autoridades reguladoras nacionais (ARN), o funcionamento da base de dados de autorizações gerais (BD AG), propondo também sugestões de melhorias.
II. Aspectos principais abordados no projeto do parecer do BEREC
A. O RAG e o sistema de notificação
Segundo o BEREC, o RGA veio simplificar a entrada de novos operadores no mercado das comunicações eletrónicas, na medida em que apenas passou a ser exigido às empresas que notifiquem as ARN competentes da sua intenção de proceder ao início da oferta de redes e serviços (ao invés de requererem pedidos de licenciamento), na maioria dos países da UE5. Esta abordagem permitiu a promoção de regras de mercado harmonizadas e transparentes em todos os Estados-Membros da UE.
Nos Estados-Membros em que, a par do RGA, vigora o sistema de notificação prévia, as ARN implementaram para o efeito o formulário de notificação adotado pelo BEREC6. Tal contribuiu para a harmonização dos requisitos da notificação, facilitando o acesso ao mercado e promovendo maior consistência nas notificações efetuadas pelas ARN ao BEREC.
B. Funcionamento da Base de Dados das Autorizações Gerais (BDAG)
A BD AG funciona como um repositório central das notificações apresentadas pelas empresas de comunicações eletrónicas, sendo as ARN responsáveis por carregar essas informações para a BD AG. No entanto, têm-se registado alguns desafios na operacionalização desta BD, tais como dificuldades na sua utilização, ineficiências e falhas no carregamento de dados. Neste sentido, o BEREC considera crucial introduzir melhorias ao funcionamento da BD AG para aumentar a eficiência global do RAG.
C. Principais desafios na aplicação do RAG
Como principais desafios na implementação do RAG nos vários Estados-Membros, destacamos os seguintes identificados pelo BEREC:
Compatibilidade de informação constante das bases de dados das ARN e da BD AG: é necessário garantir o alinhamento entre as bases de dados nacionais relativas às notificações recebidas e a categorização de redes e serviços proposta pelo BEREC. Com efeito, algumas das categorias de redes e serviços definidas pelo BEREC no modelo de formulário de notificação não são compreendidas da mesma forma por todas as ARN, o que pode gerar incompatibilidade entre as informações constantes dos seus formulários de notificação e o modelo de formulário do BEREC, criando, assim discrepâncias e entraves à simplificação de processos.
Clara compreensão da categorização proposta pelo BEREC: decorre do ponto anterior que não existe uma interpretação unívoca, especialmente pelas empresas notificantes, das categorias de redes e serviços definidas pelo BEREC (e.g., âmbito dos serviços máquina-a-máquina, acesso à Internet por satélite, serviços TETRA), especialmente nas notificações apresentadas antes da entrada em vigor do CECE. A definição de orientações e exemplos claros de determinadas categorias de redes e serviços podem contribuir para redução de ambiguidades e maior consistência da informação.
D. Sugestões de melhoria
Para fazer face aos desafios identificados, o BEREC sugere a implementação das seguintes melhorias:
Alinhamento dos sistemas de notificação nacionais: As ARN devem assegurar que os seus sistemas nacionais são compatíveis com a categorização do BEREC, devendo aquelas adaptar as bases de dados e os formulários de notificação conforme necessário. Este alinhamento facilitará a integração dos dados e o cumprimento da regulamentação.
Clarificação do RAG: poderão ser disponibilizadas pelo BEREC orientações claras sobre os dados de identificação exigidos às empresas notificantes sediadas fora da UE extracomunitárias, na medida em que tal pode contribuir para aumentar a clareza e a transparência do RAG.
Clarificação das categorias de redes e serviços: A publicação de esclarecimentos e exemplos adicionais em relação a determinadas categorias de redes e serviços no modelo de notificação do BEREC pode contribuir para uma interpretação e aplicação mais consistente do RGA pelas ARN, especialmente no que respeita à transmissão de dados ao BEREC.
E. Contribuições dos stakeholders
Perante o sumário e considerações tecidas no documento, o BEREC pretende, em particular, obter contribuições das entidades interessadas quanto a saber se:
III. Conclusões
O projeto de parecer do BEREC está em consulta pública até 26 de julho de 2024. Após este prazo, o BEREC pretende adotar seu parecer final até dezembro de 2024, continuando os atuais ajustes em ajustes em curso, especialmente no que respeita aos requisitos de notificação das AG. O BEREC terá ainda em consideração o Livro Branco da Comissão Europeia sobre as necessidades de infraestruturas digitais, de 21 de fevereiro de 2024, quanto a definir se o regime da AG deverá abranger empresas que ofereçam serviços de comunicações interpessoais independentes de números (e.g., WhatsApp, Messenger), redes virtualizadas ou SDN’s (software defined networks).
Vendo o tema de modo transversal, dir-se-á que este exercício do BEREC evidencia a importância de legisladores e reguladores reflectirem periodicamente sobre a adaptabilidade dos quadros regulamentares aos avanços tecnológicos rápidos e à dinâmica dos mercados emergentes. De facto, será que os princípios de simplificação e transparência do RAG podem ser aplicados a outros setores? Como garantir que a automação e simplificação, impulsionadas por tecnologias como a IA, não comprometem a supervisão humana e o uso de discernimento em situações específicas? Estas considerações podem ser para aperfeiçoar e estender o RAG a outros setores regulados, garantindo que o mesmo satisfaça necessidades atuais e futuras do mercado.
1 Lei n.º 16/2022, de 16 de agosto.
2 Diretiva 96/19/CE da Comissão, de 13 de março que altera a Directiva 90/388/CEE no que diz respeito à introdução da plena concorrência nos mercados das telecomunicações e procede à supressão de todos os direitos especiais e exclusivos que restringem o fornecimento de serviços de telecomunicações e a oferta das redes correspondentes por empresas estabelecidas na Comunidade
3 Directiva 2002/20/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 7 de Março de 2002, relativa à autorização de redes e serviços de comunicações electrónicas (“Directiva Autorização Geral”)
5 De salientar que a Dinamarca e a França são os únicos países da UE cuja legislação está integralmente harmonizada com o artigo 12.º do CECE, pois nestes países as empresas de comunicações eletrónicas não estão obrigadas a notificar as ARN do início da oferta de redes e serviços de comunicações eletrónicas. Na Dinamarca vigora um regime de “autorização automática” (empresas que entram no mercado consideram-se automaticamente autorizadas à prestação de serviços) e em França, após a transposição do CECE, a obrigação de notificação foi eliminada, continuando, contudo, a ARCEP a atuar como a entidade responsável pela gestão das outras obrigações relacionadas com as AG (e.g., alocação de recursos escassos como espectro e recursos de numeração).
6 De acordo com o inquérito realizado pelo BEREC, o modelo de formulário implementado não é igual em todos os Estados-Membros, pois, por força da legislação nacional, por exemplo, de direito societário, as ARN podem necessitar de dados adicionais aos previstos no modelo adotado pelo BEREC, sendo que algumas ARN, como é o caso da ANACOM, também solicitam que as empresas indiquem nos formulários detalhes sobre as redes e serviços a oferecer.